O Artigo que segue abaixo foi retirado na integra do Site Jus Vigilantibus, trata da evolução histórica da pena como vingança, escrito por por Diomar Cândida Pereira Dias, achei interessante o mesmo, haja vista o tema inicial da matéria Direito Penal II, ministrada pelo Professor Sandro Luiz, trata da Sanção Penal, sendo importante entendermos o que é a PENA, e este artigo é bem interessante.
1.1 CONCEITO DA PENA
O conceito de pena dado pelo
Direito Penal, que se traduz pela “expiação ou castigo estabelecido pela lei,
com o intuito de prevenir e de reprimir a prática de qualquer ato ou omissão
de fato que atente contra a ordem social, o qual seja qualificado como
crime ou contravenção”, uma vez que a ideia de pena, desde os primórdios,
sempre esteve associada a castigo, como ainda é vista pela sociedade nos dias
atuais.
·
Para Aníbal Bruno, “pena é a sanção,
consistente na privação de determinados bens jurídicos, que o Estado impõe
contra a prática de um fato definido na lei como crime.”
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Para Franz Von Liszt , “a pena é um mal
imposto pelo juiz penal ao delinqüente, em virtude do delito, para expressar a
reprovação social em relação ao ato e ao autor.”
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Edmund Mezger, entende que” pena é a
imposição de um mal proporcional ao fato”, ou seja, uma privação de bens
jurídicos que alcança o autor como motivo e na medida do fato punível que tenha
cometido.
·
Giuseppe Betiol, a pena é uma
consequência jurídica do crime, ou seja, a sanção estabelecida pela violação de
um preceito penal;
·
Aníbal Bruno, a pena é a sanção,
consistente na privação de determinados bens jurídicos, que o Estado impõe
contra a prática de um fato definido na lei como crime.
1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA PENA
1.2.1 A Vingança Privada
Nos primórdios da civilização a
concepção da pena girava em torno da prevalência da lei do mais forte (Lei de
Darwin), onde cabia a auto-composição, conhecida como vingança de cunho pessoal
(vingança privada), utilizada pelo ofendido em busca de sanar a lide, sendo
esta faculdade de resolução, dada a sua força própria, grupo ou família, para
assim conseguir exercê-la em desfavor do criminoso.
A pena não obedecia ao princípio
da proporcionalidade, quando de sua aplicação vingativa se estendendo à família
do acusado.
E, na hipótese do criminoso
pertencer à mesma tribo da vítima, a sanção penal visava condenado-o à perda da
paz ou banimento do membro do clã, sendo que por esta decisão o agressor perdia
a proteção do grupo ao qual pertencia, podendo ser agredido por qualquer pessoa
e consequentemente se encontrava exposto a forças hostis de outras tribos ou da
própria natureza, isto, se concretizava na morte do condenado.
Mas, na realidade os homens
primitivos já necessitavam de crer num poder superior, sobrenatural, daí
adoravam e cultuavam objetos denominados Totens que exigiam respeito e
obrigações, e o descumprimento dessas regras por qualquer indivíduo ocasionavam
sanções à sociedade, enquanto da obediência sobrevinha recompensa.
Portanto, a pena era de caráter
sacro e essa vingança pessoal não era tida como punição, mas como um meio de
restauração da integridade coletiva perante a divindade cultuada.
Aníbal Bruno afirma:
“ (...) não a encontramos, em
geral, como forma de reação punitiva dentro de uma comunidade primária. Lançar
mãos ao agressor, para feri-lo ou matá-lo, em gesto de vingança, devia parecer
à consciência desses grupos, impregnada das concepções de totem e tabu, tão
condenável quanto à agressão. A reação é a expulsão do grupo, que não só
eliminava aquele que se tornara um inimigo da comunidade e dos seus deuses e
forças mágicas, como evitava a esta o contágio da mácula de que se contaminara
o agente, violando o tabu, e as reações vingadoras dos seres sobrenaturais, a
que o grupo estava submetido.”
No Brasil, os povos indígenas
adotavam valores culturais de punição condizentes à vingança de sangue, regra
de Talião, a perda da paz, a pena de morte através de tacape e as penas
corporais, sob a concepção de suas crendices, sendo que as "práticas
punitivas desses povos indígenas em nada influíram na legislação
brasileira".
Neste sentido, René Ariel Dotti,
afirma:
“Ter encontrado sinais de punição
na forma do talião e da vingança do sangue para as lesões cometidas nas tribos
indígenas brasileiras. Acrescenta que a perda da paz também era utilizada,
porém predominavam a pena de morte (através do tacape) e as penas corporais.”
Nessa fase vemos, há pratica
desproporcional à ofensa, atingia não só o ofensor, como também todo o seu
grupo familiar. As relações Totêmicas ainda prevaleciam.
1.2.2 Composição
Com a evolução social, bem como a
necessidade de evitar genocídios, surge a Lei Mosaica (Talião), surgindo o
primeiro indício de proporcionalidade entre pena e delito, ao prescrever a
máxima “sangue por sangue, olho por olho, dente por dente”, portanto,
restringia-se à retribuição proporcional ao mal causado.
A legislação penal das
civilizações do antigo oriente caracterizou-se pela natureza religiosa de suas
normas e os ritos para aplacar a ira dos deuses ao condenado e assim,
reconquistar a benevolência desses deuses.
A prática da lei de Talião, foi
adotada pelo Código de Hamurabi (século XXIII a C.), na Babilônia, pela
legislação hebraica (Êxodo) e pela Lei das XII Tábuas, em Roma.
Nilo Batista exemplifica o método
da proporção utilizada pelo Rei Hamurabi:
“Na antiga legislação babilônica
editada pelo rei Hamurabi, verifica-se que se um pedreiro construísse uma casa
e esta desabasse, matando o morador, o pedreiro seria morto; no entanto, se
também morresse o filho do morador, o filho do pedreiro haveria de ser
sacrificado. De nada adiantaria ter observado as regras usuais nas construções
de uma casa, ou pretender associar o desabamento a um fenômeno sísmico (uma
acomodação do terreno, por exemplo). Seria, sempre, objetivamente responsável;
ele e sua família, dependendo da extensão do dano causado.”
Nesta época, sumariamente surge a
composição, quanto "aos delitos privados, utilizava-se a composição e a
faida, ou seja, a inimizade contra o infrator e sua família, que deveriam
sofrer a vingança do sangue" ou ainda, na fase da composição havia a
substituição do cumprimento da pena pelo pagamento (moeda, gado, vestes etc) e
conseqüente reparação do dano causado. Foi adotado pelo Código de Hamurábi,
pelo Código de Manu, na Índia e pelo Pentateuco.
1.2.3 Vingança Divina
Com a queda do Império Romano, no
século IV, e a conquista dos povos germânicos (bárbaros – estrangeiros)
sobreveio o direito germânico, porém sob forte influência da Igreja e o seu
direito canônico, pela qual a vingança divina era exercida a proporcionalidade
do “pecado” cometido pelo acusado contra Deus.
O fator que contribui para essa
consolidação da influência da igreja é o fortalecimento do poder centralizado
do Direito germânico, que buscava adquirir com maior amplitude o caráter de
poder público estatal, daí a adoção da concepção da Igreja de oposição à
pratica individualista da vingança privada (vingança do sangue) utilizada no
início do domínio dos povos germânico, embora essa interpretação das escrituras
sagradas eram deturpadas e os métodos de verificar a culpabilidade provinham de
uma revelação divina inquestionável que impunha provações das mais variadas, a
fim de corrigir o infrator.
Estado e Igreja, se confundiam ao
exercer o poder, mas houve uma evolução no sentido da prisão-pena, agora vista
sob duas ópticas : custódia e eclesiástica, utilizada para punir clérigos
faltosos, com penas em "celas ou a internação em mosteiros" com a
finalidade de fazer com que o recluso meditasse, refletisse e se arrependesse
da infração cometida. Nesta fase histórica surgiu a privação de liberdade como
pena. O cárcere era tido como penitência e meditação, o que originou a palavra
“penitenciaria”.
A vingança divina foi adotada na
Índia (Código de Manu), Babilônia (Código de Hamurábi), Israel (Pentateuco),
Egito (Cinco Livros), Pérsia (Avesta), China (Livros das Cinco Penas) etc.
1.2.4 Vingança Política
No século XV, com a queda de
Constantinopla, em 1.453, e o desaparecimento do feudalismo, surge a Idade
Moderna, e consigo inúmeras guerras religiosas, e por resultado a pobreza se
generalizou por todo o continente europeu e consequentemente o número de
desafortunados e delinquentes, nesta fase o Estado busca assumir sua função de
heterocomposição, embora, com influências da Igreja, "cujo mérito atingido
pelo Direito Penal canônico foi consolidar a punição pública como a única justa
e correta, em oposição à pratica individualista da vingança privada utilizada
pelo Direito germânico" .
No Estado absolutista a pena foi
concebida como um castigo, uma expiação pelo pecado cometido contra o soberano,
que se identificava com Deus, que lhe concebia o poder diretamente e o
concentrava todo em suas mãos, daí a faculdade do Estado de impor penas.
Sobre este período histórico
manifesta Cezar Roberto Bitencourt , citando o entendimento Von Hentig:
“ Tudo isso logo cresce
desmesuradamente. Este fenômeno, como já referimos, estendeu-se por toda a
Europa. Por razões de política criminal era evidente que ante tanta
delinqüência, a pena de morte não era uma solução adequada, já não se podia
aplicar a tanta gente.”
Com o fim do feudalismo, iniciou
a era do capitalismo como regime econômico, sendo um dos principais motivos da
criação das prisões meio emergente para conter a grande massa de classe menos
favorecida do regime dominante, o qual implantava disciplinas e às condições
impostas ao trabalho do regime capitalista.
Sobre esta época de transição
feudal ao capitalismo, Rusche e Kirchheimer, ensina, que “a pena serviu também
para suprir a falta e a crescente necessidade de mão-de-obra. Portanto, as
casas de correção ou de trabalho, para onde eram mandados os condenados, foram
os antecedentes do que hoje conhecemos por cárcere" .
E para solução desse impasse o
Direito Penal é utilizado como segregação social com penas: de expulsão,
trabalhos forçados em encanamentos para esgotos ou galés. Esta ”consistia na
obrigação de remar em navios de guerra, acorrentado aos bancos de seus porões,
caracterizando-se uma verdadeira prisão flutuante”.
Mas, não sendo o suficiente este
método de segregação, na metade do século aduzido surge um grande movimento de
criação e construção das prisões.
Para cumprimento da pena
privativa de liberdade, a prisão era utilizada com a finalidade de controlar,
submeter a classe menos favorecida o novo regime econômico em desenvolvimento.
Enfim, não possuía caráter de
ressocialização, mas sim de aproveitar a mão-de-obra gratuita imposta pelas
prisões do século XVI, além de manter a prevenção geral.
No entanto, o sistema de
aplicação punitiva estatal (vingança pública - inquisitória), permanecia
baseado em penas pecuniárias, penas corporais e na pena capital. Para Dario
Melossi e Massimo Pavarini:
“ (...) o surgimento da
prisão-pena explica-se menos pela existência de um propósito humanitário e
idealista de reabilitação do delinqüente, e mais pela necessidade emergente de
possuir um instrumento que permitisse a submissão da classe menos favorecida ao
regime dominante, vale dizer, o capitalismo. O importante era fazer com que o
recluso se acostumasse com o modo de produção, submetendo-se a ele e tornando
ainda mais fácil o controle social.”
Portanto, a prisão era tida como
um meio de coagir o trabalhador livre a acostumar com o regime capitalista, o
qual os remunerava com míseros salários.
Por outro lado, a pena, atendia à
prevenção geral, através da qual o trabalhador livre sentia-se intimidado e com
medo de ser enclausurado em uma casa de trabalho, motivo pelo qual acabava por
se acostumar à disciplina e às condições impostas ao trabalho no regime
capitalista, ou ficarem presos nas casas de trabalhos, que exigiam os trabalhos
forçados do presidiário sem lhes remunerar (exploração), sistema iniciado na
Inglaterra e desenvolvida entre os holandeses.
Michel Foucault, afirma que a
prisão é menos recente do que se costuma dizer:
“A forma prisão preexiste à sua
utilização sistemática nas leis penais. Ela se constitui fora do aparelho
judiciário, quando se elaboram, por todo o corpo social. o processo para
repartir os indivíduos, fixá-los e distribuí-los espacialmente, classificá-los,
tirar deles o máximo de tempo, e o máximo de forças, treinar seus corpos,
codificar seu comportamento contínuo, mantê-los numa visibilidade sem lacuna,
formar em torno deles, um aparelho completo, de observação, registro e
notações, constituir sobre eles um saber que se acumula e se centraliza.”
Neste período de transição a
Igreja perdeu parte de seu poder, sendo agora a imagem de representante do
onipotente transferido ao Monarca, que significava o Estado e era reconhecido
pelos súditos a quem deferiram o poder de castigá-los. Poder justificado pelo
filosofo Thomas Hoobes , na obra o Leviatã (1.651).
A vingança agora é tida por
pública, definida em leis absolutas, imprecisas, “com várias janelas,
interpretativas” e imperfeitas, que na realidade buscava manter no poder o
monarca que aplicava a lei, nas diversas áreas do direito, ou seja, as leis
foram feitas sob seu aval e a exegese, aplicação e execução penal no mesmo
intuito.
A pena predominante era a de
morte, aplicada por meios cruéis e desumanos como pela forca, fogueira, roda,
arrastamento, esquartejamento, estrangulação, sepultamento em vida etc.
Neste período de plena expansão
capitalista, sobreveio a situação flutuante do mercado de trabalho, dada a
ampliação de mercados para consumi-la, em virtude dos descobrimentos marítimos,
o que ocasionava o fluxo de mão-de-obra para as novas terras conquistadas na
América, África e Ásia, além das baixas humanas em conseqüência de epidemias e
guerras.
Portanto, necessário se fez a
aplicação de outras penas, tais como o confisco, a mutilação, os açoites, a
tortura, as penas infamantes, o banimento temporário, o perdimento de bens,
trabalhos forçados etc.
Por outro lado, o pai do
liberalismo John Locke , justificava a necessidade do liberalismo individual
humano, contrastando sua tese capitalista e de Thomas Hoobes, já que o homem
crendo em si mesmo para própria melhoria, e ainda sobre a necessidade da
divisão de religiosidade e Estado.
Fato ocorrido em 1.690 em sua
obra o Ensaio sobre o governo civil estabelecendo os princípios de que o homem
delegou direitos ao Estado, poderes de regulamentação das relações externas na
vida social, pois reservou para si uma parte de direitos que são indelegáveis:
liberdades fundamentais, o direito à vida, como todos os direitos inerentes à
personalidade humana, são anteriores e superiores ao Estado.
Por outro lado, no Brasil,
estávamos na fase do “descobrimento” e posterior colonização, adveio a
legislação penal exportada pela Coroa Portuguesa, constantes nas famosas
Ordenações do Reino.
No período colonial, vigoraram as
Ordenações Afonsinas (até 1512), Ordenações Manuelinas (até 1569), ambas
tratavam do tema penal em que a privação da liberdade era utilizada apenas para
garantir o julgamento ou como meio coercitivo no pagamento da pena pecuniária.
As Ordenações Filipinas, foram
introduzidas em nosso Direito penal em razão das alterações exigidas pelo
Imperador da península Ibérica, o monarca Felipe, nelas estavam contidos muitos
delitos e variadas formas de suplício a serem aplicados ao corpo do condenado,
sendo esta modalidade confundida com a fundamentação teológica, porém, vale
dizer que se constituíam nas principais armas políticas do soberano para manter
o controle social.
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