24 de fev. de 2012

Direito Constitucional–Conceito, Classificação, Fontes e Objeto. - APOSTILA

O material que segue abaixo é de autoria do Professor Vitor Condorelle, disponível no academico, que aqui venho somente transcreve-lo
constituicao federal
1. CONCEITO, CLASSIFICAÇÃO, FONTES E OBJETO.
O Direito Constitucional é a ciência jurídica que se organiza num conjunto de princípios e normas estabelecendo a organização de um ente estatal e tem por objeto o estudo da Constituição de um Estado. Numa classificação dicotômica entre direito privado e público, o direito constitucional é um ramo do direito público interno que tem como função fixar os princípios básicos dos demais ramos do Direito.
Divide-se em: Direito Constitucional Positivo, Direito Constitucional Comparado e Direito Constitucional Geral (Descritivo e Prescritivo), conforme demonstra abaixo:
  • DIREITO CONSTITUCIONAL POSITIVO - O Direito Constitucional Positivo é aquele que tem por objeto de estudo uma determinada constituição. Assim, por exemplo, o estudo sistemático da onstituição da República Federativa do Brasil de 1988 é um estudo que é feito pelo direito constitucional positivo, assim como também o é o estudo da constituição americana, por exemplo.
  • DIREITO CONSTITUCIONAL COMPARADO - O Direito Constitucional Comparado, como o próprio nome diz, é aquele que realiza um estudo comparativo das normas existentes em duas ou mais Constituições. Assim, se o nosso estudo tiver por objeto a comparação das liberdades civis constitucionais abraçadas pelas constituições do Brasil e dos Estados Unidos, por exemplo, estaremos exatamente dentro dos limites impostos pelo Direito Constitucional Comparado, pois aqui o interesse não é a análise de uma constituição, mas sim a comparação de mais de uma delas, mesmo que o foco da comparação seja específico, como no caso exemplificado, que é o da análise das liberdades civis.
  • DIREITO CONSTITUCIONAL GERAL - O Direito Constitucional Geral é aquele que não se detém a constituições específicas. Ele tenta vislumbrar elementos, conceitos e princípios que devem (ou deveriam) estar presentes em todas as constituições. Em outras palavras, o Direito Constitucional Geral é o ramo do saber que tenta identificar se há princípios gerais inerentes (ou que deveriam ser inerentes) a todas as constituições, independentemente de suas peculiaridades.
Segundo inúmeros doutrinadores, são cinco as fontes do Direito Constitucional, a saber:
a) DIREITO NATURAL. Fonte legitimadora de todo e qualquer preceito de direito positivo, a expressão "Direito Natural" teve origem em Roma, por influência da filosofia grega. Os juristas romanos afirmavam a existência de um direito comum a todos os povos e superior ao direito escrito (positivo). O Cristianismo aperfeiçoou o Direito Natural, pois este coincidia com suas orientações filosóficas e políticas. Porém, foi São Tomás de Aquino quem deu o maior desenvolvimento ao Direito Natural, uma vez que a lei natural era uma lei universal, superior às leis
humanas, e constituía o fundamento de toda a ordem jurídica, com base em que o ser humano revela 3 instintos dos quais emergem as normas básicas e naturais da vida social. São eles: a) instinto de conservação da espécie; b) instinto de propagação da espécie; c) instinto da necessidade de viver em sociedade com seus semelhantes;

b) CONSTITUIÇÃO ESCRITA. Vontade soberana do povo manifestada através do poder constituinte. É a fonte direta e principal, no campo da positividade jurídica

c) COSTUMES² Regras firmadas no decorrer da evolução social. Têm destacada influência nos países de Constituição não escrita (exemplo: a Inglaterra). Essa fonte, porém não perde a sua importância nos países de Constituição escrita, porque serve de roteiro necessário ao legislador constituinte;

d) JURISPRUDÊNCIA DOS TRIBUNAIS³. É de suma importância nos países de Constituição escrita, onde o mais alto órgão do Poder Judiciário exerce a função de intérprete máximo e guardião da Lei Magna;

e) DOUTRINA. Tem desempenhado papel de alta relevância na formação e na transformação do direito em geral, pois é a captação de conhecimento através de opiniões de estudiosos do Direito4. O Direito Constitucional ocupa posição de superioridade em relação às outras ciências jurídicas e, assim, as demais normas jurídicas não podem contrariar, em hipótese alguma, dispositivos constitucionais. Em síntese, temos:
NORMAS JURÍDICAS podem ser CONSTITUCIONAIS ou INFRACONSTITUCIONAIS.
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CONSTITUCIONAIS:
  • Originárias: São aquelas inseridas na Constituição, quando de sua criação, e até hoje inabaláveis (dispositivos originais da Constituição que não sofreram qualquer tipo de alteração).
  • Derivadas:São aquelas inseridas na Constituição, quando de sua mudança (dispositivos que foram resultado do processo de reforma por Emendas ou Revisão).
Obs.: Com a promulgação da EC n.º 45/2004 (Reforma do Judiciário), os Tratados Internacionais que cuidem de direitos humanos e que tenham sido aprovados em ambas as Casas do Congresso Nacional, em dois turnos e por 3/5 dos votos dos membros, possuirão o status de Emenda Constitucional e, portanto, norma constitucional derivada (art. 5.º, §3.º da CF).

INFRACONSTITUCIONAIS (ou SUBCONSTITUCIONAIS)
  • Atos normativos primários (normas legais): São os que têm o seu fundamento na própria Constituição (ex.: emendas à Constituição, leis complementares, leis ordinárias, leis delegadas, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções (legislativas), os tratados internacionais, os atos normativos dotados de certa autonomia (que não são meramente regulamentares como, por exemplo, o regimento dos tribunais) e os decretos ou regulamentos autônomos).
  • Atos normativos não-primários ou concretos (normas infralegais): São aqueles que derivam do poder regulamentar de que dispõe o Chefe do Poder Executivo (ex.: decretos meramente regulamentares, portarias, instruções e os autos de infração).
A Constituição pode ser definida como a lei fundamental e suprema de um Estado que contém normas referentes à estruturação do Estado, à organização dos Poderes e aos direitos fundamentais.
Sem embargo dessa conceituação, admitem-se várias concepções ou sentidos do que seja uma Constituição. Cada concepção aponta um fundamento diferente para o texto constitucional, a saber:

1ª Concepção: Sociológica (ou sociologismo constitucional). Datada do ano de 1862, seu principal expoente é Ferdinand Lassalle que a propôs no livro “A Essência da Constituição”. Lassalle fazia a distinção entre a Constituição real (ou efetiva) e a Constituição escrita. Em todo Estado, ao lado da Constituição escrita, existe também uma Constituição real ou efetiva, que segundo Lassalle é a soma dos fatores reais de poder que regem uma determinada nação (em síntese, a representação da realidade). Por ser uma concepção sociológica, a Constituição real sempre irá prevalecer sobre a Constituição escrita. Para Lassalle, caso a Constituição escrita não corresponda à real, não passará de uma mera “folha de papel”;

2ª Concepção: Política (ou concepção decisionista). Elaborada no ano de 1929, foi defendida por Carl Schmitt no livro "Teoria da Constituição". “Constituição”, para Schmitt, é apenas aquilo que decorre
de uma decisão política fundamental. Tomando a CF/88 como exemplo, os temas tratados que são decorrentes de uma decisão política fundamental anterior são: direitos fundamentais; organização do Estado; organização dos Poderes. O restante que não decorre de uma decisão política fundamental não passa de “leis constitucionais”. Essas leis constitucionais estão relacionadas ao conceito formal de Constituição, pois são apenas formalmente constitucionais, e não aterialmente;

3ª Concepção: Jurídico-Normativa (ou concepção positivista). Surgida ao final da 2ª Guerra Mundial, tem como principal expoente Hans Kelsen e Konrad Hesse, sendo considerada a concepção predominante nos dias atuais.
Em seu livro “Teoria Pura do Direito”, Kelsen determinou que a Constituição é um conjunto de normas como as demais leis, ou seja, ela encontra o seu fundamento no próprio direito. Kelsen faz a seguinte distinção: Constituição em sentido lógico-jurídico e Constituição em sentido jurídicopositivo. A Constituição em sentido lógico-jurídico é a chamada norma fundamental hipotética. Essa norma é chamada de fundamental porque é o fundamento da Constituição em sentido jurídicopositivo (Constituição escrita). A norma fundamental hipotética é chamada de hipotética porque não é posta, mas pressuposta: “todos devem obedecer a Constituição”. No nosso caso seria a CF/88. É algo que está no direito positivo, no topo na pirâmide. A norma infraconstitucional deve observar a norma superior e a Constituição, por conseqüência. Dessa concepção nasce a idéia de supremacia
formal constitucional e controle de constitucionalidade, e de rigidez constitucional, ou seja, necessidade de proteger a norma que dá validade a todo o ordenamento.
Konrad Hesse é o autor que mais contribuiu para a concepção jurídica de Constituição, inclusive exercendo uma forte influência sobre a jurisprudência do STF. Seu livro mais conhecido é intitulado “A Força Normativa da Constituição”. A teoria de Hesse foi elaborada como uma antítese à tese defendida por Ferdinand Lassalle. Segundo Konrad Hesse, apesar de muitas vezes sucumbir à realidade, a Constituição tem uma força normativa capaz de modificar a realidade, obrigando as pessoas. Basta que para isto exista “vontade de Constituição”, e não apenas “vontade de poder”;

4ª Concepção: Culturalista - A concepção culturalista não cria nada novo, mas associa-se a aspectos relevantes das concepções anteriores (que possuem fundamentos complementares, e não antagônicos). É associada à idéia de CONSTITUIÇÃO TOTAL, que é uma Constituição que trata de todos os aspectos/assuntos da vida social. De acordo com esta concepção, a Constituição é fruto da cultura existente dentro de determinado contexto histórico, em uma determinada sociedade, e ao mesmo tempo, é condicionante dessa mesma cultura, pois o direito é fruto da atividade humana. José Afonso da Silva e Meirelles Teixeira são alguns dos autores que defendem essa concepção;

5ª Concepção: Simbólica. Marcelo Neves defende que a norma é mero símbolo. O legislador não a teria criado para ser concretizada. Nenhum Estado Ditatorial elimina da Constituição os direitos fundamentais, apenas os ignora. Ex: salário-mínimo que "assegura" vários direitos;

6ª Concepção: Aberta. Defendida por Peter Häberle e Carlos Alberto Siqueira Castro. Leva em consideração que a Constituição tem objeto dinâmico e aberto, para que se adapte às novas expectativas e necessidades do cidadão. Se for aberta, admite emendas formais (EC) e informais (mutações constitucionais), está repleta de conceitos jurídicos indeterminados. Ex: art. 5º, XI, CF – no conceito de "casa" está incluso a casa e o escritório onde exerce atividade profissional. A idéia dele é que nós devemos urgentemente recusar a idéia de que a interpretação deve ser monopolizada exclusivamente pelos juristas. Para que a Constituição se concretize e necessário que todos os idadãos se envolvam num processo de interpretação e aplicação da constituição. O titular o poder constituinte é a sociedade, por isso ela deve se envolver no processo hermenêutico de materialização da constituição. Essa idéia abre espaço para que os cidadãos participem cada vez mais nessa interpretação;

2. ESTRUTURA
De um modo geral, a atual Constituição, está divida em 03 (três) partes:
PREÂMBULO – Embora não seja considerado como norma constitucional, representa a parte introdutória que sintetiza os ideais e a própria finalidade da Constituição, o pensamento que norteou o trabalho de elaboração do texto constitucional. O Preâmbulo não tem relevância jurídica, não tem força normativa, não cria direitos ou obrigações, não tem força obrigatória, servindo, apenas, como norte interpretativo das normas constitucionais (TESE DA IRRELEVÂNCIA JURÍDICA)5.

Um exemplo é a referência ao nome de Deus. Dependendo da tolerância do Estado quanto à religião, será um Estado confessional com uma religião oficial (a exemplo da Constituição de 1824), ou um Estado leigo ou laico, com uma posição de neutralidade em matéria confessional (Igreja e Estado são instituições separadas). Com base nessa idéia, pode-se afirmar que o Estado brasileiro é leigo ou laico (art. 5.º, VI c/c 19, I da Constituição). A afirmação do nome de Deus no Preâmbulo, em um Estado leigo, não é contraditória, porque não envolve o sectarismo; não há partido para nenhuma religião, e Deus é único para todas as religiões. Portanto, o Brasil é um Estado leigo, mas teísta, por expressar a existência de um Ser Supremo6;

PARTE PERMANENTE (ou CORPO) – É o conjunto de normas que formam o texto da Constituição. Está desmembrada em 09 (nove) Títulos compostos de 250 (duzentos e cinqüenta) artigos, dispostos da seguinte maneira:

Título I - Dos Princípios Fundamentais (arts. 1.º a 4.º);
Título II - Dos Direitos e Garantias Fundamentais (arts. 5.º a 17);
Título III - Da Organização do Estado (arts. 18 a 43);
Título IV - Da Organização dos Poderes (arts. 44 a 135);
Título V - Da Defesa do Estado e das Instituições Democráticas (arts. 136 a 144);
Título VI - Da Tributação e do Orçamento (arts. 145 a 169);
Título VII - Da Ordem Econômica e Financeira (arts. 170 a 192);
Título VIII - Da Ordem Social (arts. 193 a 232);
Título IX - Das Disposições Constitucionais Gerais (arts. 233 a 250).
PARTE TRANSITÓRIA – Contém regras oriundas da nova Constituição, como também regras de transição entre as Constituições (normas constitucionais de aplicabilidade esgotada e eficácia exaurida7). É o chamado ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias. Atualmente apresenta 97 (noventa e sete) artigos, com a atualização dada pela EC nº 62/2009.

3. CONTEÚDO.
As normas constitucionais (artigos, parágrafos, incisos e alíneas) estão dispostas da seguinte maneira:
SENTIDO:
Material (Análise quanto ao conteúdo da norma) - São normas que estabelecem aspectos fundamentais da estrutura do Estado, da organização dos Poderes e dos direitos fundamentais, estejam ou não, inseridas na Constituição. Portanto, o que importa é a matéria de que trata a norma e não sua localização.
Exemplos: art. 18, §2.º; art. 29,caput; art. 32, caput; art. 44, caput...
Formal8 (Análise quanto à localização da norma) - São aquelas que estão presentes na Constituição, pouco importando seu conteúdo, isto é, não necessitam ser consideradas normas materialmente constitucionais. O que interessa é a localização.
Exemplos:art. 242, §2.º

4. ELEMENTOS DAS CONSTITUIÇÕES.
1. Orgânicos - Normas que regulam a estrutura do Estado e do Poder, dispondo sobre sua organização e modo de funcionamento.
Exemplos: Título I, Título III, Título IV, art. 142 (forças armadas), art. 144 (segurança pública)...
2. Limitativos - Manifestam-se nos direitos e garantias fundamentais, limitando a atuação dos poderes estatais.
Exemplos: Título II, com exceção do Capítulo II (Dos Direitos Sociais – arts. 6.º a 11).
3. Sócio-ideológicos - Revelam aspectos sociais e econômicos..
Exemplos: Título VI, VII, Título VIII, Capítulo II do Título II (Direitos Sociais – arts. 6.º a 11).
4. De estabilização Constitucional - São normas que possibilitam a integração e a harmonia constitucional. Asseguram a solução de conflitos constitucionais, a defesa da Constituição, do Estado e das instituições democráticas, estabelecendo os meios e técnicas contra sua alteração e infringência, bem como para sua modificação.
Exemplos: Título V (Estado de Defesa e de Sítio), art. 103 (controle de constitucionalidade), arts. 34 a 36 (intervenção)...
5. Formais de aplicabilidade - Regras de aplicação dos dispositivos da Constituição.

Exemplos: Título IX e ADCT

1 - O povo, através de seus constituintes (deputados e senadores), fazendo as leis que definem a estrutura do Estado, estabelece a tríplice divisão do poder e asseguram o direito à vida, à liberdade, à propriedade, e à segurança, a todo e qualquer cidadão no território nacional. É sem sombra de dúvidas o primeiro documento jurídico da Nação.

2 - Expressão pública de idéias; a manifestação consciente e instintiva da vontade social, repetida (dizer, fazer, escrever) tacitamente como lei não escrita, e que integra como lei, o direito positivo.

3 - Reiteradas decisões dos Tribunais sobre a interpretação do mesmo (de um mesmo) preceito jurídico e sua aplicação em face de fatos (casos) análogos. A Jurisprudência deu origem às Súmulas (resumos de julgamentos semelhantes sobre casos semelhantes) dos Tribunais.
4 - As primeiras Constituições escritas foram inspiradas nas doutrinas de Montesquieu (O Espírito das Leis, 1748), Jean-Jacques Rousseau (O Contrato Social, 1762), John Locke (Segundo Tratado Sobre o Governo Civil, 1690), Rodolf Von Ihering (A Luta Pelo Direito, 1872) e outros.

5 - O Supremo Tribunal Federal, no julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 2.076-AC, rel. Min. Carlos Velloso, em relação à inexistência dessa referência na Constituição do Estado do Acre), decidiu que o Preâmbulo não tem valor jurídico-normativo, pois não se situa no âmbito do Direito, mas no domínio da Política, refletindo posição ideológica do constituinte, sem relevância jurídica. Daí que, segundo o STF, o Preâmbulo tem natureza política, mas não jurídica. Ou seja, para o STF, o Preâmbulo não é norma jurídica, não é norma constitucional, mas um enunciado de princípios políticos, sem força jurídica para obrigar, proibir ou permitir com uma eventual sanção por seu descumprimento. Segundo o STF, concluise, o descumprimento ao contido no Preâmbulo não enseja a aplicação de uma sanção jurídica, porquanto o Preâmbulo não seja norma jurídica.
6 - Por suas características, a invocação à divindade feita no Preâmbulo não é de reprodução obrigatória nos Preâmbulos das Constituições dos Estados e Leis Orgânicas do DF e dos Municípios.
7 - A exemplo dos arts. 3.º, 13, 14, 15 e 27 do ADCT.
8 - Apesar da Constituição de 88 ser formal, quanto ao conteúdo, nela existem normas materiais e formalmente constitucionais.

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